terça-feira, 19 de maio de 2015

Louvor egocêntrico



Pense no repertório cristão que você ouve e canta, seja na sua casa, na rua ou na igreja. Já parou para analisar o que você está cantando? Por experiência própria, parece que muitas vezes, no meio do louvor, deixamo-nos levar pelo calor do momento, pela condução da banda, pelo clima do ambiente e cantamos sem sequer pensar no impacto e significado do que estamos proclamando. Ou você pensa em todas as conseqüências de cantar “Eu entrego tudo a Ti, tudo a Ti”, no meio do louvor?

Agora, dentro deste exercício de análise, pare para observar quantas vezes, no texto das músicas, estão presentes as palavras “eu” e “meu”. “EU entrego”, “EU te louvarei”, “EU te adoro”, “MEU coração”, e assim por diante...

Creio que seja natural falar de Deus a partir de nós mesmos, porque como não entendemos, medimos ou capturamos Deus em palavras ou pensamentos, precisamos partir do eu que é palpável, mensurável e compreensível pela nossa mentalidade para falar deste Ser indescritível. 

Não condeno o uso do “eu” nas músicas; o próprio salmista, em várias passagens, ao falar da sua relação com Deus, precisa fazer uso destes termos. O problema é quando o louvor faz mais menção do “eu” do que faz de Deus. Quando fala mais sobre minhas ações do que proclama a grandeza do Altíssimo. Quando coloca meus sentimentos na frente das demais coisas, ignorando que também estes sentimentos vêm Dele. Quando substitui o anúncio da maravilhosa criação de Deus pela exaltação de nossas qualidades. Quando ordena a Deus o que Ele deve fazer, ao invés de confessar “que seja feita a Tua vontade”. Quando determina o que e como Deus deve agir, ao invés de se submeter ao Rei dos Reis. Quando apresenta textos baseados em nossos próprios “achismos” e sentimentalismos, deixando de falar do que está escrito na Palavra...


O louvor é um momento de adoração ao Pai, não de auto-bajulação. Pense nisso e lembre que, assim como o culto é realizado para/por/com Deus, em nome Dele, o louvor parte de nós mesmos, mas tem como alvo nosso Pai que está no céu. 

quarta-feira, 8 de abril de 2015

E isso bastou!

O cenário, mais uma vez, estava armado. O altar, transformado em palco, estava adornado com as mais variadas decorações. Um verdadeiro show de luzes refletia nas paredes de todo templo, misturando-se à fumaça de gelo seco que invadia o ar. Vídeos com efeitos modernos estavam sendo projetados, enquanto a multidão escolhia o melhor lugar, que poderia ser aquele perto do ar condicionado, ou talvez algum mais próximo das potentes caixas de som... Quem sabe? Todos assentos eram estofados mesmo, altamente confortáveis. Não havia grandes diferenças.

A banda já estava a postos, armada dos mais modernos instrumentos e equipamentos de som. Tão logo a multidão tomou seus assentos e lotou o templo, o som explodiu naquele lugar... E sumiu.

Se no princípio da criação do mundo Deus disse “Haja luz”, bom, naquela noite sua ordem decretou o contrário. O culto havia começado, mas houve uma queda de energia. De repente, não havia mais luzes no palco – aliás, se alguém entrasse ali e não conhecesse o lugar, nem saberia que havia um palco lá. Não havia mais fumaça de gelo seco, ou projeções em datashow, ou sistema de som moderno, ou ar condicionado. Nem a banda conseguia tocar! E como o pastor ia falar sem um microfone?

O burburinho surgiu no meio da multidão. “O que faremos?” “Será que acabou o culto?” “Será que vai demorar pra luz voltar?“Como vamos fazer o culto sem luz? Acho que vou pra casa” “Nossa, que calor, quero o ar condicionado de volta”, e assim por diante. Alguns já iam levantando-se e indo em direção à saída, quando uma voz lá da frente gritou pedindo por silêncio, e disse:

-  Pessoal, ouve uma queda de luz na região, e não temos previsão de volta. Realmente, estamos sem a maioria dos nossos recursos funcionando, mas convido a todos os que quiserem para que permaneçam aqui – mesmo sem som, sem ar condicionado, sem banda acompanhando o louvor. Não viemos a este lugar na busca de conforto físico; bom, pelo menos não deveria ser esta nossa motivação. Viemos buscar a presença do Pai, e Ele está em todos lugares – até naqueles onde não temos conforto algum. Viemos buscar a comunhão com outros irmãos e bem, você pode não estar vendo muito bem aqueles que estão a sua volta, mas eles estão aí. Viemos buscar a Palavra, e temos ela em nossas mãos, ainda que não possamos a ler neste exato momento. Viemos orar e interceder pelos nossos irmãos, e fazemos isso de olhos fechados: que falta faz a luz?

Então o dono da voz, pastor da comunidade, pegou um violão e do modo mais simples e acústico possível, cantou com a comunidade. O resultado foi de arrepiar: a multidão fez sua voz soar e preencher aquele lugar. E louvou como nunca havia feito; não havia banda para “embelezar” as canções, não havia solos instrumentais sem fim, não havia uma voz sobressaindo à outra. Havia naquele lugar uma só voz: a voz do povo de Deus, adorando-O de coração, em Espírito e em Verdade. E isso bastou.

E o pastor pregou sem utilizar efeitos visuais. Tudo que havia era o som de suas palavras e o povo absolutamente quieto, prestando atenção em cada palavra. No meio da escuridão, ninguém tinha coragem nem de pegar seus celulares e conferir as últimas mensagens recebidas. Ora, se Moisés pregou para o povo de Israel inteiro sem microfones e caixas de som, porque eles também não poderiam? E isso bastou.

E o povo orou. Os olhos nem precisaram ser fechados... E cada um orou da sua maneira, em um momento de real intimidade com o Pai. E isso bastou.

Por fim, as pessoas se despediram umas das outras e se abençoaram entre si. Não se via o rosto alheio; não se via que roupas a pessoa usava, como estava seu cabelo, que jóias estava ostentando. A única coisa que existia eram abraços, apertos de mão, palavras de carinho e sinceridade. E isso bastou.

Naquela noite, não houve luz dentro da igreja, mas nunca antes ela estivera tão iluminada pela Luz. E isso mais do que bastou!

terça-feira, 24 de março de 2015

O que é ser "do mundo"?

Bom, para começar: não SOMOS todos nós do mundo? Ou é melhor perguntar: não ESTAMOS todos nós no mundo? O que é “do mundo” e o que não é? Li agora há pouco a seguinte frase:
O cristão não é uma pessoa que vive isolada, ele não é do mundo, mas está no mundo.”*
Prefiro afirmar de outra maneira: o cristão não é uma pessoa que vive isolada; ele não é do mundo, ESTÁ no mundo, mas PROCEDE de maneira diferente dos demais”. Porque somos criaturas que nascem e vivem neste lugar, de certa forma, pertencemos a ele. Faz parte de nossa identidade; ainda que nossa cidadania esteja no céu (Fp 3:20), de onde esperamos por nosso Senhor e Salvador, estamos todos aqui, por enquanto, no mundo. Mas por sermos cristãos, nossa natureza deve ser diferente, já que o próprio Cristo nos chama a ser sal da terra.


Ser sal da terra implica em sermos diferentes. Que diferença que faz sal no alimento! Tudo pode ter sido preparado da melhor maneira, mas sem o sal, o alimento fica insosso, sem graça, sem sabor. Nós também, como cristãos, devemos procurar fazer a diferença nos lugares onde Deus nos coloca, tal como o sal em uma refeição. 

Tantas pessoas buscam tempero para suas vidas em festas, bebedeiras, promiscuidade, pornografia, drogas em geral... E essa busca incansável pelo prazer não as leva a lugar algum! Isso porque o real sabor só encontra aquele que busca a Cristo, acima de todas as demais coisas. 

O sal já foi utilizado como meio de conservação dos alimentos. Em tempos em que não havia geladeiras e refrigeradores, o sal prolongava o tempo de vida útil da comida, ao desidratá-la e assim diminuir o ambiente úmido que propicia a aparição de micro-organismos. Não podemos nós, cristãos, também “desidratar”nossos ambientes e evitar a proliferação do mal? Creio que este é nosso chamado! 

Não somos chamados a nos apartarmos no mundo, nos fundindo em guetos cristãos, mas sim a no mundo testemunhar da graça e do amor de Cristo a todos aqueles que estão ao nosso redor, sejam eles cristãos ou não! 

  “O cristão deve proceder de forma exemplar, a fim de, assim, ganhar para Cristo os que não crêem”. 1 Pe 2.11-12

O próprio Cristo nos deu o exemplo: ele andava com pecadores. Todos somos pecadores, mas ele andava com aqueles que eram (e ainda hoje são) considerados maiores pecadores que os demais. Seriam hoje a prostituta, o alcoólatra, o drogado, o traficante, o ladrão, o estuprador... O ponto em questão é: JESUS SE MISTURAVA! Ele não se apartava do que era “do mundo”, criando um clube exclusivo de seus fieis seguidores, mas sim, também incluía-se no universo sujo e pecaminoso de sua sociedade. Porém, estando com Ele com pecadores, não se deixava contaminar pelo pecado deles, e sim chamava-os para uma nova vida, libertos da escravidão do pecado. 

Assim também acredito que podemos pensar em relação à música. Não precisamos nos restringir ao repertório exclusivamente cristão. Nossas playlists também podem carregar a tal “música do mundo”; por que não poderia? Tal como Jesus, não devemos nos apartar de tudo aquilo que não é santo, mas sim contagiar aqueles e aquelas que ainda não conheceram Ele através de nosso exemplo – e também de nossas músicas! 

Já disse Aslam, nas Crônicas de Nárnia de C.S. Lewis, que não temos como saber como as coisas seriam se não fossem exatamente como são agora. Mas uma das certezas que eu tenho: se Cristo viesse para a Terra hoje, ele ouviria música “do mundo”. 

 *Fonte: http://refugioteologico.blogspot.com.br/2012/10/o-que-significa-ser-o-sal-da-terra.html

quarta-feira, 18 de março de 2015

E aí, você ouve música “do mundo”? (parte 1)

Eu ouço. E acho essa expressão “música do mundo” muito curiosa. Entendo que ela surge como um termo que se propõe a separar o universo sagrado do profano, denominando como sendo “do mundo” o material que é teoricamente profano. Muito utilizado também é o termo “música secular”... Mas que tal, antes de qualquer reflexão, entendermos as raízes destas expressões? 

O sagrado está associado a elementos “considerados dignos de respeito e devoção espiritual, ou que inspiram temor ou reverência entre os crentes em um determinado conjunto de ideias espirituais (...) A palavra ‘sagrado’ provém do latim sacrum, que se referia aos deuses ou a alguma coisa em seu poder” (fonte: Wikipédia). Em termos musicais, podemos considerar como sagrados os nossos hinos (música sacra), já que eles se encaixam dentro da definição apresentada. 

Em contraposição temos o termo “profano”, que por sua vez diz respeito ao “que é estranho à religião ou não está de acordo com os preceitos religiosos.Que desrespeita a santidade de coisas sagradas: ações profanas diante dos preceitos bíblicos” (fonte: http://www.dicio.com.br/profano/). Ora, se uma música não é sagrada, ela é automaticamente profana? Por que uma música não tem o objetivo de inspirar uma devoção espiritual, ela então não está de acordo com o que a bíblia nos ensina? 

Só para citar um exemplo: “I still haven’t found what I’m looking for”, um dos hits mais conhecidos da banda secular irlandesa U2. Não é uma música sagrada... Não é um hino... Mas como considerar profana uma música que claramente fala de Cristo, na vinda de seu Reino, na culpa carregada por Ele na cruz? Eu não consigo.